Dieta Low-Carb e Paleolítica: Foco primário em calorias ou em carboidratos? 2 - Keswick,1956 by Dr. Souto

Essa é a continuação da matéria postada pelo Dr. Souto, simplesmente sensacional!
Coloco na integra o post do mesmo e no final o link levando direto ao site dele.


Esta é a segunda de 3 postagens mostrando que já se sabe há décadas que a restrição calórica voluntária não é a melhor alternativa para perda de peso. Não se trata de novidade, de dieta da moda. Isso é sabido há mais de 60 anos.

Na postagem anterior, abordamos a dieta de baixo carboidrato de Pennington em duas publicações de 1953, nas quais o Dr. Pennington explica que a restrição de carboidratos leva a uma redução calórica espontânea, sem fome e sem redução do metabolismo basal.

Hoje veremos fascinante artigo experimental publicado em 1956 por Kerwick e Pawan na prestigiosa revista médica The Lancet, que responde à questão: será que as calorias são todas iguais??



O artigo começa explicando que a restrição calórica leva à perda de peso, mas que a fome acaba sendo um obstáculo ao seu sucesso no longo prazo.

Os autores decidiram, então, realizar uma série de experimentos em voluntários obesos, internados em ala metabólica. Lembre-se, isso é 1956, antes da era dos ensaios clínicos randomizados. No entanto, não faltava engenhosidade aos cientistas da época, como veremos.

O primeiro experimento.
Neste primeiro experimento, todos os voluntários receberam dietas com as mesmas proporções de macronutrientes (20% proteína, 33% gordura e 47% carboidratos). Apenas as calorias foram variadas: por 7 a 9 dias, cada paciente foi submetido a uma dieta de 2000, 1500, 1000 e 500 calorias. O resultado, como esperado, indicou que a restrição calórica emagrece:


No século 21, a maioria dos profissionais de saúde para por aqui: precisa comer menos calorias para perder peso - passar fome é inevitável. Mas não em 1956: naquela época, a ortodoxia nutricional ainda não havia banido as hipóteses alternativas. E nossos cientistas foram adiante.

O segundo experimento.
Segue o original, e eu traduzo abaixo:
"A prova final de que a quantidade de peso perdido depende diretamente do deficit calórico deveria ser obtida observando uma perda de peso constante em cada paciente cuja ingestão (hipo)calórica é mantida constante, independentemente do tipo de comida contida na dieta.Catorze pacientes foram colocados em dietas nas quais as calorias foram mantidas constantes em 1000 calorias por dia, e 90% da dieta foi fornecida como carboidratos, gordura ou proteína [por 5 a 9 dias cada]".
Então, para deixar claro: todos os pacientes receberam dietas de 1000 calorias por dia por 3 semanas, mas a cada semana a dieta mudava e era composta por 90% de um macronutriente: carboidratosproteína ou gordura. Sabemos, pelo primeiro experimento, que as calorias são importantes. Mas será que a ÚNICA coisa que importa são as calorias? Vejamos o resultado:



Vejamos... O grupo que comeu 90% gordura perdeu mais peso. O grupo que comeu 90% proteína perdeu peso, mas um pouco menos do que o grupo da gordura. O grupo que comeu comida mista (20% proteína, 33% gordura e 47% carboidratos) perdeu a metade do peso, mas perdeu. Agora, no grupo que comeu 90% carboidratos... metade dos pacientes GANHOU um pouco de peso, mesmo comendo 1000 calorias por dia. E os que perderam, perderam menos do que nos demais grupos.

O terceiro experimento.
O terceiro experimento foi uma confirmação do segundo, mas dessa vez com excesso de calorias. Os voluntários foram alimentados com 2000 calorias de uma dieta mista, e alguns mantiveram o peso, enquanto outros ganharam peso. No entanto, quando foram alimentados com 2600 calorias de dieta low carb, OS MESMOS pacientes PERDERAM peso. Olhe só:



Observe, acima: com exceção do paciente número 4, TODOS os demais ganharam peso com 2000 calorias contendo cerca de 50% de carboidratos, mas PERDERAM peso com 2600 calorias de dieta low carb, high fat.

A seguir, as conclusões do estudo:


 
 

Conclusões:
  1. A perda de peso é possível com qualquer tipo de dieta que restrinja calorias;
  2. A taxa de perda de peso é proporcional à restrição calórica QUANDO as proporções de macronutrientes são mantidas constantes;
  3. Quando as calorias foram mantidas constantes em 1000 por dia, contudo, a taxa de perda de peso variou tremendamente em dietas de diferentes composições. A perda foi mais rápida em dietas de alta gordura; foi menos rápida em dietas de alta proteína; e o peso foi mantido por curtos períodos em uma dieta de 1000 calorias se o principal macronutriente foi carboidrato.
  4. Com a ingestão de 2000 calorias por dia, o peso foi mantido ou aumentou em 4 de 5 pacientes obesos. Nas mesmas pessoas, uma perda de peso significativa ocorreu quando as calorias aumentaram para 2600 ao dia, desde que tal dieta fosse composta principalmente de gordura e proteína.
  5. Não ocorreram defeitos de absorção de nutrientes que pudesse explicar a perda de peso. Não houve nem perda, nem ganho de proteína no corpo, nem do estoque corporal de carboidratos em um grau que pudesse explicar a perda de peso (essas coisas foram todas mensuradas);
  6. A perda de peso nestas dietas foi parcialmente derivada de água (30-50%) e o restante foi de gordura corporal (50-70%);
  7. Como a taxa de perda de peso variou de forma tão marcada com a composição da dieta, mesmo com calorias constantes, sugere-se que estes pacientes alteraram seu metabolismo em reposta à composição da dieta.

***

Recapitulando:

  • Na postagem anterior, vimos que Pennington já tratava a obesidade com restrição de carboidratos desde o início dos anos 1950, pois havia observado que a perda de peso ocorria sem fome.
  • No estudo atual, Kekwick investigou as alegações de Pennington com uma série de engenhosos experimentos, mostrando que as calorias não são todas iguais quando o assunto é perda de peso. A restrição de carboidratos facilita sobremaneira a perda de peso.
  • Na próxima postagem dessa série, vamos avaliar o mesmo fenômeno, à luz dos modernos ensaios clínicos randomizados, que anos depois vieram a comprovar o que todo mundo já sabia há mais de 60 anos - mas que foi esquecido durante a idade média nutricional.

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